Privatizar e terceirizar enfraquecem o estado e prejudicam a população

CASO 1: Desde o final do ano de 2023, o TRT-SC enfrenta dificuldades com a gestão dos contratos envolvendo as empresas prestadoras de serviços terceirizados de limpeza e conservação, especialmente no que se refere a atrasos no pagamento de salário, do vale-alimentação e do vale-transporte.

CASO 2: Em Florianópolis, operação policial dia 18 de janeiro atinge a gestão Gean/Topázio desnudando esquemas de contratação de empresa terceirizada para coleta de lixo. As acusações envolvem crime ambiental de poluição, fraude em licitação, corrupção passiva e ativa, associação criminosa e lavagem de dinheiro. O Sintrasem, Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Florianópolis, vinha denunciando desde 2017 o processo de desmonte e terceirização da Comcap, que cuida da limpeza urbana da capital. Em 2024, a Prefeitura elevou a Taxa de Coleta de Resíduos Sólidos em 17,5%, aumento de 4,4 vezes a variação acumulada da inflação no Brasil em 12 meses. Em um ano e dois meses, Santa Catarina já teve 18 prefeitos presos em investigações por corrupção e fraude em licitações, principalmente de limpeza urbana.

CASO 3: Em Porto Alegre, temporal dia 16 de janeiro deixa milhares de famílias sem água nem luz. A Equatorial Energia, empresa privada que, em 2021, comprou a empresa pública de energia do estado por apenas R$ 100 mil, à época demitiu metade do quadro de funcionários. Agora, alegava não ter pessoal suficiente para consertar estragos na cidade. Prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, que, como deputado, votou pela privatização, em rede social reclamou pelo fato de a empresa de luz não atender o telefone. Ele apelou para que “alguém da empresa” aparecesse em reunião convocada pela Prefeitura.

CASO 4: Em São Paulo, dezenas de milhares de pessoas passaram muitas horas sem energia após um temporal. Lá, a responsabilidade é da Enel, que adquiriu a Eletropaulo em 2018. Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Enel da Assembleia Legislativa de SP apontou irregularidades e negligências cometidas pela concessionária entre 2018 e 2023, principalmente depois do apagão de 3 de novembro. Na ocasião, alguns bairros chegaram a ficar mais de quatro dias sem luz.

Os quatros exemplos escancaram a realidade escondida pelo discurso de que privatizar e terceirizar melhoram e barateiam os serviços prestados à população. No caso dos serviços públicos, a terceirização, resume a professora e pesquisadora Graça Druck, “é o meio através do qual se busca transformar o trabalho público no trabalho privado, trazendo a insegurança, a instabilidade e a relação de exploração”. A afirmação está em um artigo do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate) intitulado “A terceirização no serviço público brasileiro: instrumento de privatização do Estado”, de 2021, que pode ser lido em https://www.anfip.org.br/wp-content/uploads/2021/02/RA-CADERNO-17-FONACATE.pdf

No Judiciário Federal, atualmente terceirizam-se atividades como as de recepcionista, telefonista, servente e vigilante, entre outras, e nem a Justiça do Trabalho consegue evitar abusos na relação de trabalho, como mostram os atrasos no pagamento de salário, de vale-alimentação e de vale-transporte de terceirizados. O problema não é novidade para quem acompanha essa realidade. A precarização do trabalho e a quebra de direitos andam juntas com a terceirização, e casos como esse se repetem continuamente. Uma empresa que presta serviços terceirizados à Justiça Federal do Rio Grande do Sul também estava atrasando os pagamentos de salários e vales alimentação e transporte, conforme notícia publicada pelo Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal e do Ministério Público da União no Rio Grande do Sul (Sintrajufe/RS). Sem salário, trabalhadores precisaram vender o celular para poder se alimentar (https://sintrajufe.org.br/em-resposta-ao-sintrajufe-rs-direcao-do-foro-da-jf-diz-que-previsao-e-de-que-trabalhadoras-e-trabalhadores-terceirizados-recebam-nesta-sexta-feira-12-os-pagamentos-atrasados/).

Segundo o Relatório Justiça em Números 2023, do CNJ, o Poder Judiciário tem 145.406 trabalhadores auxiliares, contratados na forma de terceirização (50,4%) e estágio (36,7%). No período de 2009 a 2022, houve aumento nas duas formas de contratação, de 87,5% entre terceirizados e de 50,1% entre estagiários. Outras terceirizações estão aparecendo. Em 2022, o TRT-SC contratou empresa especializada para prestação de serviços de administração, gerenciamento e controle da margem consignável e consignações em folha de pagamento

DISCURSO DA MÍDIA

Para alertar a população de Florianópolis sobre os impactos negativos da terceirização, o Sintrasem faz um trabalho cotidiano nas redes sociais e também nas ruas, distribuindo material informativo. Um desafio é quebrar o discurso da mídia hegemônica catarinense, hoje Grupos ND e NSC, que usam casos pontuais e específicos para defender a privatização da Comcap. A lógica é a mesma dos grupos nacionais de comunicação ao venderem a ideia de que servidores custam muito, justificando assim a privatização de serviços públicos.

O secretário geral do Sintrasem, Valcioni Fernandes Agaci Filho, diz que a cada Greve por direitos, além dos ataques da mídia, vêm as multas sobre o Sindicato, mas em contrapartida crescem as filiações, hoje chegando a números recordes na categoria: “Mostramos que como Sindicato estamos firmes e fortes para defender os trabalhadores e a população, reafirmando a importância do serviço público de qualidade”.

O coordenador do Sintrajusc Adailton Pires Costa afirma que, sob o discurso da modernização, a terceirização implica retrocesso social, pois nada mais é do que um comércio de pessoas para prestarem serviços em condições precarizadas: “Além de tudo, é um retrocesso histórico, pois quando o Brasil saiu da escravidão, no final do século XIX, uma das formas mais comum de contratação dos trabalhadores livres e libertos era a terceirização dos serviços”. Portanto, isso não tem nada de novo.

Hoje, observa ele, esses escândalos criminosos de sonegação de direitos dos trabalhadores terceirizados só confirmam que os Sindicatos estavam certos em denunciar essa forma vergonhosa de contratação: “Desde seu início, a terceirização foi sinônimo de sonegação de direitos, precarização do serviço, aumento de jornada, redução de salário, intensificação da rotatividade, perda dos benefícios sociais, aumento da corrupção e má-prestação do serviço público”. Isso tudo, conclui Adailton, ocorre não por causa dos trabalhadores terceirizados, e sim por culpa das empresas muitas vezes de fundo de quintal que as administrações públicas contratam e dos regimes laborais flexíveis sem amparo constitucional que os tribunais passaram a aceitar como se fossem a boia de salvação do capitalismo periférico.

Na quarta-feira (24), ato organizado pela Frente de Servidores, centrais sindicais, movimentos sociais e estudantis reuniu centenas de manifestantes em Porto Alegre para denunciar os efeitos da privatização. A manifestação exigia a reestatização da empresa de luz e investimentos emergenciais (foto de capa).

Foto: Sintrajufe/RS