MST encerra seu 5° Congresso e reafirma luta pela Reforma Agrária

Em um clima de muita poesia, as atividades do 5º Congresso do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) finalizaram na sexta feira, dia 15. Além do estudo sobre os valores humanistas que norteiam a organização e da bela mística de encerramento, o Movimento reafirmou a necessidade de fortalecer as alianças com movimentos da cidade e de lutar contra o atual modelo econômico, condições primeiras para que o programa de Reforma Agrária, discutido durante o Congresso, possa ter possibilidades de concretização.
No próximo período, o MST vai priorizar o fortalecimento de alianças com setores organizados e ampliar o diálogo com a sociedade, para defender a mudança no modelo econômico, que concentra poder e riqueza, atinge os trabalhadores e traz conseqüências quase irreversíveis ao meio-ambiente. Essas intenções foram formalizadas na Carta do 5º Congresso Nacional do MST (leia abaixo). Segundo Fátima Ribeiro, da direção nacional, o momento é de reunir o conjunto das forças sociais na defesa de um outro modelo de desenvolvimento. “Não é papel apenas do MST, mas do conjunto das organizações populares do Brasil”, afirmou.
Para Gilmar Mauro, da direção nacional do Movimento, o documento – organizado em 18 pontos – é uma “agenda propositiva” e será apresentada às organizações populares. No texto, estão pautados temas como a defesa dos direitos dos trabalhadores, o combate às transnacionais do agronegócio, a limitação do tamanho de propriedade rural, o fim do trabalho escravo e da violência no campo e a desapropriação de latifúndios de empresas estrangeiras e bancos.
A carta também enfatiza a questão ambiental, ao defender a preservação da biodiversidade, da água e das florestas. O MST, que tem na educação uma das suas prioridades, também defende o acesso dos trabalhadores à educação e propõe uma campanha pela erradicação do analfabetismo no Brasil. Como forma de romper com o monopólio da mídia, a carta defende a democratização da comunicação, por meio da criação de meios comunitários como rádios e TV.
O MST também reafirma, no documento, sua posição contrária à transposição do rio São Francisco e defende o controle dos camponeses sobre os agrocombustíveis. No segundo semestre, o movimento também se dedicará, com outras organizações, à realização de um plebiscito popular pela anulação da privatização da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). Além de outras agendas em comum que serão construídas com outros movimentos de trabalhadores.
O V Congresso do MST, maior da história do movimento, reuniu trabalhadores rurais de 24 estados do Brasil, além de 181 convidados internacionais de 31 países.

Investir no relacionamento humano é o desafio cultural do MST

Nas atividades do último dia de Congresso, ainda houve espaço para debates. Pela manhã, o monge beneditino Marcelo Barros, e o membro do MST, Ademar Bogo foram os convidados para debater os valores humanistas que norteiam a organização.
Em sua fala, Marcelo Barros propôs que a “mãe Terra” abençoasse os participantes do Congresso, ao mesmo tempo em que criticou o capitalismo vigente no mundo que provoca o individualismo e a transformação da terra em mercadoria. “Se nós resistirmos a todos os decretos de exploração, se nós resistirmos a todos os decretos de opressão é por que nós temos uma missão de liberdade”, explicou.
De acordo com Barros, o MST é pioneiro em ações que negam esquemas de explorações comuns ao neoliberalismo. As práticas de economia solidária e cooperativismo foram os exemplos utilizados de formas de respeito aos trabalhadores e de diálogo com a terra. “Ao invés de comprar a última quinquilharia do capitalismo, nós produzimos poesia e companherismo”, disse.
Já Ademar Bogo apresentou as principais bases que sustentam o projeto de cultura do MST para uma transformação sócio-cultural do camponês organizado. Bogo destacou a forma coletiva que o Movimento tem para formular idéias e pensamentos e destacou as crenças num Estado Popular. “Eles não podem nos tirar o direito de construir uma sociedade socialista”, afirmou sob os aplausos acalorados de toda plenária.
Dentre as bases apresentadas por Bogo, três aspectos foram destacados o caráter popular, a cultura que abre espaço para o respeito ao gênero e, por último, o sistema socialista como base para a formação da sociedade. “Nós não produziremos comida para os carros da sociedade. O nosso projeto é anticapitalista e antiimperialista”, afirmou.
“As nossas tarefas são muitas. Destaco a de preparar militantes sensíveis com ética e sensibilidade com todos os seres da natureza, o de organizar e conscientizar o povo para a luta, além de formular idéias; forçar a imaginação para buscar respostas ao que a sociedade precisa. Nós precisamos contestar o capital, enfrentar o Estado capitalista e investir no relacionamento humano”, conclui.

Leia abaixo o inteiro teor da carta:

Carta do 5º Congresso Nacional do MST

Nós, 17.500 trabalhadoras e trabalhadores rurais Sem Terra de 24 estados do Brasil, 181 convidados internacionais representando 21 organizações camponesas de 31 países e amigos e amigas de diversos movimentos e entidades, estivemos reunidos em Brasília entre os dias 11 e 15 de junho de 2007, no 5º Congresso Nacional do MST, para discutirmos e analisarmos os problemas de nossa sociedade e buscarmos apontar alternativas.
Nos comprometemos a seguir ajudando na organização do povo, para que lute por seus direitos e contra a desigualdade e as injustiças sociais. Por isso, assumimos os seguintes compromissos:

1. Articular com todos os setores sociais e suas formas de organização para construir um projeto popular que enfrente o neoliberalismo, o imperialismo e as causas estruturais dos problemas que afetam o povo brasileiro.
2. Defender os nossos direitos contra qualquer política que tente retirar direitos já conquistados.
3. Lutar contra as privatizações do patrimônio público, a transposição do Rio São Francisco e pela reestatização das empresas públicas que foram privatizadas.
4. Lutar para que todos os latifúndios sejam desapropriados e prioritariamente as propriedades do capital estrangeiro e dos bancos.
5. Lutar contra as derrubadas e queimadas de florestas nativas para expansão do latifúndio. Exigir dos governos ações contundentes para coibir essas práticas criminosas ao meio ambiente. Combater o uso dos agrotóxicos e a monocultura em larga escala da soja, cana-de-açúcar, eucalipto, etc.
6. Combater as empresas transnacionais que querem controlar as sementes, a produção e o comércio agrícola brasileiro, como a Monsanto, Syngenta, Cargill, Bunge, ADM, Nestlé, Basf, Bayer, Aracruz, Stora Enso, entre outras. Impedir que continuem explorando nossa natureza, nossa força de trabalho e nosso país.
7. Exigir o fim imediato do trabalho escravo, a super-exploração do trabalho e a punição dos seus responsáveis. Todos os latifúndios que utilizam qualquer forma de trabalho escravo devem ser expropriados, sem nenhuma indenização, como prevê o Projeto da Lei já aprovado no Senado.
8. Lutar contra toda forma de violência no campo, bem como a criminalização dos Movimentos Sociais. Exigir punição dos assassinos – mandantes e executores – dos lutadores e lutadoras pela Reforma Agrária, que permanecem impunes e com processos parados no Poder Judiciário.
9. Lutar por um limite máximo do tamanho da propriedade da terra. Pela demarcação de todas as terras indígenas e dos remanescentes quilombolas. A terra é um bem da natureza e deve estar condicionada aos interesses do povo.
10. Lutar para que a produção dos agrocombustíveis esteja sob o controle dos camponeses e trabalhadores rurais, como parte da policultura, com preservação do meio ambiente e buscando a soberania energética de cada região.
11. Defender as sementes nativas e crioulas. Lutar contra as sementes transgênicas. Difundir as práticas de agroecologia e técnicas agrícolas em equilíbrio com o meio ambiente. Os assentamentos e comunidades rurais devem produzir prioritariamente alimentos sem agrotóxicos para o mercado interno.
12. Defender todas as nascentes, fontes e reservatórios de água doce. A água é um bem da Natureza e pertence à humanidade. Não pode ser propriedade privada de nenhuma empresa.
13. Preservar as matas e promover o plantio de árvores nativas e frutíferas em todas as áreas dos assentamentos e comunidades rurais, contribuindo para preservação ambiental e na luta contra o aquecimento global.
14. Lutar para que a classe trabalhadora tenha acesso ao ensino fundamental, escola de nível médio e a universidade pública, gratuita e de qualidade.
15. Desenvolver diferentes formas de campanhas e programas para eliminar o analfabetismo no meio rural e na cidade, com uma orientação pedagógica transformadora.
16. Lutar para que cada assentamento ou comunidade do interior tenha seus próprios meios de comunicação popular, como por exemplo, rádios comunitárias e livres. Lutar pela democratização de todos os meios de comunicação da sociedade contribuindo para a formação da consciência política e a valorização da cultura do povo.
17. Fortalecer a articulação dos movimentos sociais do campo na Via Campesina Brasil, em todos os Estados e regiões. Construir, com todos os Movimentos Sociais a Assembléia Popular nos municípios, regiões e estados.
18. Contribuir na construção de todos os mecanismos possíveis de integração popular Latino-Americana, através da ALBA – Alternativa Bolivariana dos Povos das Américas. Exercer a solidariedade internacional com os Povos que sofrem as agressões do império, especialmente agora, com o povo de CUBA, HAITI, IRAQUE e PALESTINA.
Conclamamos o povo brasileiro para que se organize e lute por uma sociedade justa e igualitária, que somente será possível com a mobilização de todo o povo. As grandes transformações são sempre obra do povo organizado. E, nós do MST, nos comprometemos a jamais esmorecer e lutar sempre.

Reforma Agrária: Por Justiça Social e Soberania Popular!
Brasília, 15 de junho de 2007

Fonte: MST (Mayrá Lima e Daniel Cassol), com informações da Agência CUT