Comissão do Senado aprova relatório do arcabouço fiscal mantendo os gatilhos e amarras para os serviços públicos

Na manhã desta quarta-feira, 21, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou o parecer apresentado pelo senador Omar Aziz (MDB-AM) referente ao novo arcabouço fiscal (PLP 93/2023). O parecer traz algumas alterações em relação ao projeto aprovado na Câmara dos Deputados, mas não retira as amarras e gatilhos que ameaçam os serviços públicos.

O projeto

O novo regime fiscal pretende substituir a atual regra do teto de gastos, aprovada no governo de Michel Temer (MDB), e que congela por vinte anos os gastos públicos, permitindo que cresçam apenas na medida da inflação oficial. Para mudar a regra, o governo Lula enviou ao Congresso o PLP 93/2023. O projeto estabelece que, a cada ano, os gastos públicos podem crescer 70% do aumento da receita primária (que soma a arrecadação com impostos e transferências). Esse crescimento, porém, fica limitado a um aumento real que deve variar entre 0,6% e 2,5%, dependendo do cumprimento de outras metas econômicas. De acordo com o PLP, o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deve apontar as metas de resultado primário da União para os quatro anos seguintes, com uma margem de tolerância de 0,25 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) para mais ou para menos. A intenção do Poder Executivo é zerar o déficit primário em 2024 e atingir superávits de 0,5% em 2025 e 1% em 2026. O PLP prevê, ainda, algumas exceções, despesas que ficam fora da regra fiscal, e certas limitações para o caso de o governo não cumprir as metas estabelecidas.

Limites e gatilhos não foram mexidos; nomeações e reposição de perdas acumuladas sob ameaça

O projeto original já trazia amarras para recuperação das perdas acumuladas e para a expansão dos serviços públicos. Mas, na Câmara, foram criados “gatilhos”, transformando as restrições em proibições. Esses gatilhos serão disparados se as metas fiscais estabelecidas a cada ano não forem cumpridas pelo governo.

Conforme o texto, no primeiro ano de descumprimento, o governo não poderá criar cargos que impliquem aumento de despesa, alterar estruturas de carreira, criar ou aumentar auxílios, criar novas despesas obrigatórias, reajustar despesas obrigatórias acima da inflação, ampliar subsídios e subvenções e conceder ou ampliar benefícios tributários. Além disso, a despesa só crescerá 50% da variação real da receita do ano anterior, como já previa o projeto original. As medidas valem por um ano. Se no ano seguinte a meta for atingida, elas deixam de valer. Mas se não for, voltam mais duras no segundo ano, com novas vedações, como concessão de reajuste a servidores e servidoras, admissão ou contratação de pessoal e realização de concursos públicos, exceto para reposições de vacância. As mesmas proibições serão aplicadas se as despesas obrigatórias ultrapassarem 95% das despesas primárias.
A retirada dos gatilhos era uma das principais reivindicações das entidades sindicais. Porém, Aziz não promoveu qualquer alteração nesses itens.

Fundeb volta às exceções e sai do arcabouço

Inicialmente, o projeto enviado pelo governo previa diversas exceções, gastos que ficariam de fora do teto, como transferências constitucionais a estados e municípios; valores para o pagamento do piso salarial da enfermagem; e complementações da União para o Fundo de Manutenção da Educação Básica (Fundeb); entre outros. Na Câmara, os deputados aprovaram alterações nessa lista. Retiraram, por exemplo, da lista de exceções, o Fundeb e os recursos destinados ao pagamento do piso salarial da enfermagem.

Agora, no parecer aprovado na CAE do Senado, Aziz promoveu algumas alterações: devolveu o Fundeb às exceções, retirando-o, portanto, do cálculo do arcabouço; também tornou exceção o Fundo Constitucional do Distrito Federal, que serve pagar gastos com saúde, educação e segurança pública; e retirou do arcabouço recursos destinados a ciência e tecnologia.

Além das alterações na lista de exceções, Aziz acatou emenda do senador Oriovisto Guimarães (PODE-PR) que inclui entre o conjunto de medidas de ajuste fiscal, relacionadas no parágrafo 3º do artigo 1º, a alienação de ativos e a privatização de empresas estatais.

Não foi alterada, por outro lado, a regra referente ao período de cálculo da inflação: o governo defendia que a correção das despesas e receitas fosse feita com base na inflação registrada de janeiro a junho e uma previsão de julho a dezembro; mas, na Câmara, o projeto foi alterado para que seja utilizada sempre a inflação já conhecida, modificando o cálculo para ter base na inflação entre julho de um ano e junho do seguinte. Essa alteração, que foi mantida por Aziz, deve ter impacto de até R$ 40 bilhões para o próximo ano, valor que o governo terá que recuperar de alguma forma – a tendência é o envio de um projeto ao Congresso pedindo crédito suplementar nesse valor.

Mercado financeiro avalia mudanças

O mercado financeiro não parece preocupado com as alterações feitas por Aziz. No último domingo, 18, o jornal Valor Econômico publicou matéria sobre as avaliações do economista-chefe da Warren Rena, Felipe Salto. Ele entende que a retirada do Fundeb é “seis por meia dúzia”; para Salto, essa alteração não tem grande impacto porque a fórmula aprovada na Câmara colocou essas despesas dentro do limite do arcabouço. Salto também não apontou problemas na retirada do Fundo Constitucional do Distrito Federal. Para ele, o novo arcabouço “não é uma maravilha, mas veio a contento”. Quando um projeto está “a contento” do mercado, é hora de os trabalhadores e trabalhadoras se preocuparem.

Tramitação

Agora, o PLP vai ao Plenário do Senado e, após, retorna à Câmara, por conta das alterações promovidas pelos senadores. Porém, como as mudanças foram acordadas com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a tendência é de que o novo texto também seja aprovado rapidamente, indo à sanção presidencial – ou seja, Lula ainda poderá vetar trechos do projeto.

Do Sintrajufe-RS