Quem acredita sempre alcança. Leia aqui opinião da colega Sheila Belli sobre a atitude do juiz Manzi

Por Sheila Belli Véras
Analista Judiciário
Vara do Trabalho de Rio do Sul

“QUEM ACREDITA SEMPRE ALCANÇA”

Inicio este breve manifesto cumprimentando a todos àqueles que tiverem a oportunidade de lê-lo, bem como aos colegas servidores de todo judiciário federal, sindicalizados ou não.

Como não pude participar da Assembléia Geral realizada ontem em Florianópolis, resolvi escrever algumas palavras em resposta à matéria publicada pelo Boletim do Sintrajusc do dia 07/10/03, intitulada “Juiz do Trabalho elogia servidores não grevistas”.

Para quem não teve a oportunidade de ler referida matéria, trata-se do requerimento do Juiz José Ernesto Manzi – Titular da 1ª Vara do Trabalho de Florianópolis – ao TRT, para que fosse registrado um “elogio” oficial em todos os assentamentos funcionais daqueles servidores que optaram em não aderir ao movimento grevista contra a PEC 40.

Quando retomei minhas atividades laborais no dia 28/08/03, pude sentir de imediato as amargas conseqüências geradas pela minha paralisação; seja com pessoas que não souberam respeitar minha opção, seja com o fato de ter me sentido excluída de um grupo que até então pensava fazer parte. Em contrapartida, consegui desmistificar a imagem que muitos têm que todo grevista é indolente ou fanfarrão – ao menos para àqueles que conheceram meu trabalho, sempre exercido com extremo esmero e renomada dedicação.
Temos, todos nós, não só no ambiente de trabalho, mas em toda e qualquer relação social, de aceitar e acatar a opção e os valores alheios, diria até estimulá-los, porque se todos fôssemos ou pensássemos semelhantemente, não seríamos seres humanos, únicos e soberanos. Somos livres para manifestar nosso pensamento e ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (Art. 5º, II e IV). Por esta razão, tomo a mesma liberdade usada pelo referido Juiz em seu bizarro requerimento de “elogio“, para tecer alguns comentários e argumentos, acreditando estarem neles e não em um cargo, título ou órgão do poder judiciário, a verdadeira força que encontra a verdade e o consenso em uma discussão.

Esqueçamos até toda a argumentação e embasamento legal sobre o direito de greve, igualdade, impessoalidade ou mesmo todo o histórico de árdua e longa luta na conquista dos direitos dos servidores públicos – ainda que muitos insistam em chamá-los de privilégios. Deixemos de lado também o grau de relevância de um Juiz e a responsabilidade que o mesmo possui por seus atos e opiniões – posto que diz a Lei. Raciocinemos tão somente no cartesiano fato de que todos nós somos pagos para exercer atividades junto ao Poder Judiciário Federal e, assim sendo, servidores com direitos, mas também e acima de tudo, com responsabilidades e obrigações a serem cumpridas.

Portanto, caros colegas, a defesa de direitos consolidados e nela a opção pela eventual paralisação, em nenhum momento indica que desconheçamos nossos deveres como servidor, tão somente revela nossa disposição pelo uso legal de um direito na defesa de nossas convicções. Quem não faz uso de tal ferramenta ou dispositivo – plenamente válido e constitucional, abdicando de entrar em greve, não faz mais do que aquilo pelo qual está sendo pago para fazer, dando continuidade ao seu trabalho que já vinha sendo desempenhado.

A absorção do eventual excedente de tarefas pelos que continuaram a trabalhar, não justificaria por si só um requerimento de “elogio”, pois se assim fosse ninguém mais poderia entrar em licença ou mesmo gozar de suas férias, a não ser, é claro, que a mesma benesse fosse estendida a todo o conjunto de servidores, visto que diariamente também assumem encargos por vezes maiores que suas atribuições.
Assim sendo, dentro de tal raciocínio lógico, extremamente simples e de básico argumento, discordo ética e profissionalmente da atitude de tal Juiz. Não visualizo em seu requerimento nada de construtivo ou que possa ser digno de “elogio”, visto ainda que fere e divide toda classe de servidores, tecendo ainda mais fortemente os laços que prendem pessoas a funções comissionadas e não a valores ou ideais.
Sinto que a maioria dos servidores que não aderiram à greve, não foi porque eram a favor da PEC 40, mas sim pelo medo de perderem suas funções comissionadas. Gostaria de lembrá-los que, por detrás de um Juiz/Órgão do Poder Judiciário, existe um ser humano igual a mim ou igual a você, um cidadão que escova seus dentes, toma seu banho, passeia, se diverte e que também possui defeitos, bem como qualidades, como qualquer um de nós. Por isso, tenho a firme convicção que nem todos os Juízes pensam e agem como o Titular da 1ª Vara do Trabalho de Florianópolis e que, ao decidirem a quem delegar uma FC, saberão fazê-la utilizando critérios justos, como mérito e competência do servidor, e não pelo mesmo ter participado ou não de um movimento grevista.

Termino dedicando este texto aos grevistas e não grevistas, tomando a liberdade de plagiar algumas estrofes do nosso saudoso e inigualável Renato Russo, em sua belíssima canção “Mais Uma Vez”, que traduz encorajamento e otimismo para nossos momentos de recaídas. Um fraterno abraço.

“ Escuridão já vi pior
De endoidecer gente sã
Espera que o sol já vem (…)

Nunca deixe que lhe digam
Que não vale a pena
Acreditar no sonho que se tem
Ou que seus planos nunca vão dar certo
Ou que você nunca vai ser alguém
Tem gente que machuca os outros
Tem gente que não sabe amar
Mas eu sei que um dia a gente aprende (…)

Quem acredita sempre alcança”

Rio do Sul, 09 de outubro de 2003.