Plano de trabalho do GT da reforma administrativa tenta esconder verdadeiras intenções, mas não consegue; ameaça de ataques a atuais e futuros servidores cresce

O grupo de trabalho (GT) da Câmara dos Deputados que está discutindo uma proposta de reforma administrativa divulgou um documento que chama de “plano de trabalho”. Carregado de contradições e brechas, o plano acende o alerta para os riscos que podem emergir desse GT, criado pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (REP-PB), em parceria com o deputado Zé Trovão (PL-SC).

O documento traz o calendário para o funcionamento do GT. Estão previstas reuniões com “especialistas”, eventos e audiências, quase sempre de forma vinculada a grupos empresariais. A apresentação do relatório final está marcada para o dia 14 de julho.

Plano de trabalho mostra a que veio

Nas “premissas”, o documento afirma que seu objetivo é “desinterditar” o debate sobre a reforma. E que não fará ajuste fiscal, que o serviço público não é o vilão e que não será tratado o tamanho do Estado. Tudo isso, porém, entra em contradição com os caminhos sugeridos pelo próprio GT e também pelo texto-base que o “fundou” (veja ao final desta matéria).

Em outro momento, o documento lista o que a reforma “vai tratar” e o que “não vai tratar”. Os itens, porém, se contradizem: a reforma trataria de “economia e revisão de custos”, mas não de ajuste fiscal; trataria de “avaliação de desempenho e bônus vinculados a metas”, mas não de “reestruturação de carreiras”; trataria de “aplicação em estados e municípios”, mas não de “imposição federativa de modelo”. Ainda, fala em “fim dos privilégios”, mas não explica o que seus proponentes entendem por “privilégio” – o direito à estabilidade, por exemplo, é muitas vezes tratado pelos defensores do desmonte dos serviços públicos como “privilégio”.

A seguir, ao apontar o “escopo” do GT, o documento cita, por exemplo, o “dimensionamento da força de trabalho”, relaciona a PEC 32/2020 (a proposta do governo de Jair Bolsonaro) como exemplo e trata da ampliação das contratações temporárias, um dos pontos centrais do texto-base fundador do grupo.

O texto-base

O texto-base foi apresentado pelo deputado Zé Trovão, que alega “inchaço” do Estado – algo desmentido pelos dados internacionais – e propõe, entre outras medidas, um verdadeiro “libera geral” nas contratações temporárias, retirando a obrigatoriedade de “excepcional interesse público” (hoje, mesmo que sejam utilizadas forma de burlá-la, a legislação determina que esse tipo de contratação só pode ser feito em situações excepcionais).

O texto-base sugere ainda mudanças na organização das carreiras. Uma dessas mudanças é a utilização da “sistemática de posto ou posição”. Nesse formato, “a seleção de funcionários pode ocorrer em qualquer nível da hierarquia do órgão, os pagamentos são geralmente vinculados à produtividade individual e as avaliações de desempenho geralmente estão atreladas a questões remuneratórias”. Ou seja, poderiam ser feitas contratações diretamente para níveis superiores de carreira, em vez da promoção de servidores e servidoras que já passaram por outros níveis. Além disso, a remuneração dependeria fundamentalmente da produtividade e do cumprimento de metas. O texto propõe também o aumento na quantidade de níveis da carreira, alongando o tempo até que um servidor ou servidora chegasse aos níveis superiores.

Em outro item é levantada a questão da perda do cargo por “insuficiência de desempenho”. Como o próprio texto adverte, já há previsão legal para isso, embora ainda dependa de regulamentação geral. A retomada dessa discussão em um GT como esse, pautado por entidades empresariais e parlamentares que atuam cotidianamente contra os serviços públicos, liga o alerta sobre o produtivismo e a cobrança excessiva de metas que podem, na prática, acabar com a estabilidade.

Com informações do Sintrajufe/RS