O Fundo Monetário Internacional (FMI) reconheceu nesta quinta-feira (29) que “não alterou a vulnerabilidade” das políticas econômicas “inadequadas” do governo de Fernando de la Rúa e que “cometeu o erro” de apóia-las “durante muito tempo”. No entanto, afirmou também que a devastadora crise financeira foi “conseqüência da incapacidade das autoridades argentinas”.
O FMI declarou ainda que na Argentina existem “obstáculos políticos perenes” às tentativas de reforma econômica iniciadas sob pedidos do próprio Fundo. No esperado relatório do Gabinete Independente de Avaliação, o FMI declarou que a razão principal por trás da crise argentina, que começou no final de 2001, foi a “incapacidade das autoridades argentinas para adotar as medidas corretivas com devida antecipação”.
O Fundo reconheceu ainda que a crise do país revelou “pontos fracos no processo interno de tomada de decisões” do órgão, que neste caso levaram a continuar apoiando com desembolsos financeiros as medidas adotadas pela equipe econômica do governo de Buenos Aires.
O relatório diz que esta ajuda era “justificável” até janeiro de 2001, porque “com este grande apoio financeiro e uma decidida correção das políticas, existia certa possibilidade de êxito”. “Em retrospectiva, os recursos utilizados na tentativa de conservar a paridade (cambial) poderiam ter sido mais bem aproveitados para paliar alguns dos custos inevitáveis de abandonar a convertibilidade”, o sistema que mantinha a cotação do peso e o dólar em paridade 1 a 1, assinalou o FMI.
A crise financeira não apenas colocou um ponto final ao governo de De la Rua, como também jogou o país em uma das etapas políticas e econômicas mais instáveis de sua história. De fato, o fim dos pagamentos, decretado no final de 2001, e o grande número de credores espalhados pelo mundo, continua marcando ainda hoje as relações financeiras da Argentina com o FMI e com a comunidade internacional.
Esta situação desastrosa “teve repercussões devastadoras tanto na economia como no social e fez que muitos observadores questionassem o papel realizado pelo FMI durante a década anterior, período na qual a instituição havia tido quase sem interrupções cinco acordos de financiamento”, disse.
Os especialistas do Gabinete Independente de Avaliação tiveram “acesso especial” aos documentos da época e elaboraram o relatório divulgado nesta quinta, no qual assinalaram que “já em 2000 havia preocupação com a manutenção do tipo de câmbio e da dívida”. Segundo o FMI, “não havia uma solução fácil” para a crise argentina, país que foi uma “menina mimada” do órgão durante a década de Presidência de Carlos Menem, iniciada em 1989.
O regime de conversão, lançado precisamente durante seu mandato, havia permitido a Menem criar uma sensação de bem-estar econômico no país e, em conseqüência, recolher um amplo apoio da população e outros benefícios políticos. O plano começou a afundar durante o governo de De la Rúa, que, em uma tentativa dramática para salvar o regime, convocou como ministro da Economia Domingo Cavallo, criador do plano e chefe econômico de Menem. Em meio às convulsões provocadas pelo resgate do sistema de câmbio, “o FMI identificou corretamente que a disciplina fiscal e as reformas estruturais, sobretudo a do mercado trabalhista, eram essenciais para a viabilidade do regime de conversão”, disse o Fundo.
Apesar dessa avaliação ter sido “correta”, segundo o próprio FMI, as medidas de salvamento neste sentido não puderam avançar por causa de “obstáculos políticos perenes”. O Fundo assumiu também sua parte de responsabilidade ao admitir que “tampouco utilizou com eficácia os instrumentos disponíveis”. “Como conseqüência, o FMI manteve por muito tempo uma série de programas com a Argentina, quando as políticas apoiadas eram inadequadas”, e a partir do final de 2000 “aumentou os recursos comprometidos até chegar a US$ 22 bilhões”. (Fonte: Agência Carta Maior)