Dobra registro de acidente e doença no trabalho

As notificações de acidentes e doenças do trabalho cresceram 107% entre 2006 e 2007. Os registros passaram de 112.668 para 231.288.
 
Os dados foram levantados pela coordenadora do Laboratório de Saúde do Trabalhador da UnB (Universidade de Brasília), Anadergh Barbosa-Branco, com base em números do Ministério da Previdência Social. O aumento é devido ao sistema do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário para caracterizar acidentes e doenças relacionados ao trabalho, regulamentado pela Previdência Social em fevereiro de 2007.
 
Com a metodologia, os diagnósticos estatisticamente relacionados à atividade têm ligação automática com o trabalho, mesmo que o empregador não emita a CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho). O aumento, assim, não reflete necessariamente maior número de casos, mas sim acréscimo nas notificações ao INSS.
 
“Com a metodologia, passamos a ter condições mais objetivas de traçar estratégias de prevenção”, avalia Remígio Todeschini, diretor do Departamento de Políticas de Saúde e Segurança Ocupacional do Ministério da Previdência Social.
 
Alto registro
As doenças mentais e osteomusculares foram destaques nas notificações em 2007. A primeira teve um acréscimo de 1.324% nos registros. A segunda, de 893%.
 
“São doenças com grande relação com o trabalho, mas difíceis de serem caracterizadas como tal individualmente”, analisa Barbosa-Branco. De acordo com Mario Bonciani, vice-presidente nacional da Anamt (Associação Nacional de Medicina do Trabalho), a exigência mental e a intensidade do trabalho são as causas de problemas como esses.
 
“O trabalhador esquece a piora [dos sintomas], e a reversibilidade da doença torna-se complicada”, afirma. Ele acrescenta que doenças osteomusculares, como tendinite, e mentais, como depressão, afetam não só o ambiente profissional mas também o doméstico.
Roberto Angelo Moraes, 31, que é bancário há 16 anos, começou a sentir os sintomas da lesão por esforço repetitivo nos ombros e nos punhos em 1998. Após afastar-se e voltar à atividade, ele deixou o trabalho novamente, por causa da dor.
“Com a pressão psicológica que sofri nessa situação, tive depressão”, conta Moraes, que segue afastado do trabalho.
 
Metodologia
O Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário determina estatisticamente as doenças mais comuns de cada ocupação.
 
Se o trabalhador contrai uma doença ou sofre um acidente que faz parte desse rol, tem o caso automaticamente relacionado ao trabalho. Ele se enquadra no benefício acidentário, com direito ao recolhimento do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) durante o afastamento e à estabilidade no emprego por 12 meses depois de retornar.
 
A empresa pode contestar, no INSS, o nexo da doença com o trabalho. As firmas que reduzem os acidentes podem ter a alíquota do Seguro Acidente de Trabalho diminuída em até 50%; as que aumentam as ocorrências podem ter de pagar mais seguro.
 
Indústria
Os ramos da extração de carvão mineral, da fabricação de produtos de madeira, da reciclagem e da fabricação de coque e refino de petróleo estão entre os que mais apresentaram nexo técnico da ocorrência com o trabalho em 2007.
 
Segundo o estudo da UnB, esses são os setores que tiveram a maior proporção de benefícios acidentários (ligados à atividade laboral) em relação aos benefícios previdenciários.
 
“Toda a área industrial é muito propensa a lesões”, analisa Anadergh Barbosa-Branco, da UnB. “O setor de carvão mineral é pequeno, mas de altíssimo risco e campeão de afastamentos”, acrescenta.
 
Na última segunda-feira (5), uma explosão em uma mina em Lauro Müller, a 209 km de Florianópolis (SC), causou a morte de dois trabalhadores e deixou diversos feridos.
 
Ainda assim, tanto o sindicato dos trabalhadores como a entidade patronal ressaltam os esforços para diminuir ocorrências – um “trabalho imenso com a questão da segurança”, diz Cléber Gomes, engenheiro do Siecesc (Sindicato da Indústria da Extração de Carvão do Estado de Santa Catarina).
 
No setor petrolífero, também campeão de nexo entre ocorrência e trabalho, as preocupações já ultrapassam o campo das refinarias e siderúrgicas.
 
De acordo com Luiz Sérgio Brandão de Oliveira, coordenador da Comissão Nacional do Benzeno, em breve será estudada a situação de profissionais de distribuidoras e comércios de combustível, que também ficam expostos ao produto.
 
Informal
Para Alberto Ogata, diretor do Comitê de Responsabilidade Social da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e presidente da ABQV (Associação Brasileira de Qualidade de Vida), os setores campeões em doenças e acidentes são aqueles em que há mais empresas na informalidade.
 
Ele ressalta que há grandes indústrias siderúrgicas, de alimentos e elétricas com “nível baixíssimo de acidentes”.
 
“Na maioria das grandes empresas, o tema está em elevada prioridade, mas, quanto menor o porte, maior a dificuldade para as firmas serem bem preparadas”, diz Emerson Casali, gerente-executivo de relações do trabalho e desenvolvimento associativo da CNI (Confederação Nacional da Indústria).
 
Luís Carlos de Oliveira, coordenador do DSST do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, afirma que falta empenho das empresas para deixar o ambiente de trabalho mais seguro. “Os acidentes acontecem por falta de gestão responsável.”
 
“Às empresas cabe cumprir as normas de segurança e saúde do trabalho expedidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Aos trabalhadores cabe observar as normas expedidas pela empresa”, finaliza Casali. (Fonte: Folha de S.Paulo)