Se 2012 exigiu união dos servidores federais, em 2013 a peleia vai ser ainda maior

Fonte: Assessoria de Comunicação do SINTRAJUSC 

As três palestras no seminário “As reformas neoliberais e os servidores públicos”, realizado nesta quarta-feira, 21, no auditório do Floph Hotel, no centro de Florianópolis, deixaram claros dois fatos. Primeiro, o ano de 2012 marcou a retomada da unidade de luta dos servidores públicos federais, apesar das divergências entre sindicatos e centrais sindicais. Segundo, em 2013 esta unidade terá que ser ainda maior, porque projetos que tramitam no Congresso Nacional irão piorar a vida dos trabalhadores, sejam eles servidores públicos, celetistas, terceirizados.

O auditório ficou lotado para o evento, promovido por sete sindicatos de Santa Catarina e duas centrais sindicais (CSP-Conlutas e CUT). O primeiro a falar no seminário foi o metalúrgico José Maria de Almeida, o Zé Maria, membro da Coordenação Nacional da CSP Conlutas.  Ele enfatizou essa retomada das mobilizações, especialmente em um contexto político e econômico que acirra as disputas entre trabalhadores e patrões, nas quais entram também as políticas do Estado para beneficiar o empresariado.

O cenário internacional revela esse quadro, como as mobilizações no norte da África e a guerra  na Síria, diariamente (mal) contada nos grandes meios de comunicação. “Esses processos são expressões de luta de populações que não suportam mais viver nas condições que lhe são impostas”, disse o palestrante. Ele citou como dia histórico o 14 de novembro, quando uma greve geral uniu os trabalhadores europeus contra os planos de ajuste econômico impostos pelos governos em vários países. A pauta de reivindicações incluiu o fim dos cortes e revogação das reformas trabalhistas e da segurança social e contra o pagamento da dívida aos banqueiros, com auditoria pública da dívida. É o que setores críticos estão há anos exigindo que o Brasil faça em relação à própria dívida. Agora, esse clamor também chega na Europa.

Zé Maria lembrou que, desde 2007, com o início da crise que de lá para cá só cresce, os Estados estão salvando bancos, como aconteceu nos Estados Unidos, em países europeus e no Brasil, e a derrama desse dinheiro que sai dos cofres públicos se manifesta na redução de direitos e na demissão de trabalhadores. Os grandes grupos econômicos estão se agrupando para garantir rentabilidade, porque crise significa redução da taxa de lucro. Aí entra o Estado para dão uma mãozinha, como agora, no Brasil, onde há isenções de impostos e oferta de crédito para dar sustentação aos grandes empreendimentos. Essa decisão já gerou gritaria por parte de prefeitos, que viram despencar o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) inclusive por causa das isenções.  Mas as empresas não se contentam, querem mais e mesmo assim continuar a penalizar os trabalhadores. A General Motors, por exemplo, apesar de todas as isenções de impostos, planeja demitir 1.840 trabalhadores a partir de 26 de janeiro de 2013. É nesse cenário que o Congresso Nacional discute novas mudanças na previdência social e projetos como o congelamento dos vencimentos de servidores públicos.

O palestrante elencou os temas fundamentais para os quais é preciso a luta unificada dos trabalhadores. Um delas é contra o ACE, o Acordo Coletivo Especial, apresentado pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (SP). Com o ACE, os patrões poderão rebaixar direitos, sem que haja nenhuma segurança na lei para proteger os trabalhadores, pois o negociado com eles vai valer mais do que a lei. Zé Maria advertiu que o ACE não irá afetar apenas os trabalhadores da iniciativa privada, como parece à primeira vista: “Vai ser como na reforma da previdência, que primeiro atingiu os trabalhadores da iniciativa privada, em 1998, e depois, em 2003, os servidores públicos”.

A justificativa para o ACE é que a Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT, é antiga e impede avanços nos direitos dos trabalhadores. Ora, alertou o palestrante, a CLT tem, sim, problemas, é limitada, mas nunca impediu acordos para as empresas melhorarem as condições dos trabalhadores. “Então, o problema não é necessidade de conseguir avanços para melhorar, e sim para piorar. Essa é a razão pela qual a proposta vem de um sindicato e por encomenda das grandes empresas instaladas no ABC, porque a crise no setor de veículos é grande”, contextualizou. Há um excedente de veículos, com novas montadoras se instalando no Brasil, mas essa onda irá durar dois, três anos, e irão sobreviver as que tiverem custos mais baixos. As já instalados no ABC paulista, que são mais antigas, incorporam menos tecnologias e pagam melhores salários, e precisam, então, eliminar direitos. Aí o ACE cai com uma luva. Como no país não há proteção contra a demissão imotivada, os patrões têm grande possibilidade de pressão para arrancar acordos vantajosos para as empresas. “Por isso é importante que os trabalhadores se unam para impedir o ACE e defender o direito de greve”, finalizou Zé Maria.

 

A armadilha dos serviços essenciais

Anna Julia Rodrigues, dirigente da CUT/SC, destacou que, dentro da Central, há setores contrários aos projetos que ameaçam direitos (parte da CUT, porém, apóia a proposta do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC). A fala dela destacou as propostas de regulamentação do direito de greve, já que mais de 20 tramitam no Congresso Nacional. Anna Julia afirmou que esse direito já está garantido na Constituição Federal, e o que é preciso, sim, é regulamentar a Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Ela normatiza as relações de trabalho na administração pública em relação ao direito de organização e prevê garantias às organizações de trabalhadores do setor público. Também estabelece parâmetros para a fixação e negociação das condições de trabalho, para a solução de conflitos e para o exercício dos direitos civis e políticos. A Convenção foi aprovada em  2010 pelo Congresso Nacional e sancionada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas precisa de regulamentação por meio de uma lei complementar.

Anna Julia  destacou a contrariedade em relação à regulamentação do direito de greve:  “Se pensarmos, por exemplo, na definição de serviços essenciais, é perigoso se basear nisso, porque todo o serviço público será considerado essencial”.

 

Luta unificada garantiu recursos

Paulo Barela, membro da Secretaria Executiva Nacional da CSP Conlutas, em sua palestra destacou que a de 2012 foi a maior greve nos últimos 15 anos no setor público, talvez ainda maior do que a luta contra a reforma da previdência em 2003: “As greves deste ano tiveram ações balizadas, como ocupações de prédios, de avenidas, estradas, e enfrentando um governo duríssimo, com alto índice de popularidade”. Graças à unidade na luta, independentemente de sindicatos e centrais terem, em vários temas, posições divergentes, foi possível dobrar o governo Dilma em um contexto internacional dos mais difíceis. Em 2011, nenhum centavo foi direcionado ao servidor público. Mas, com as greves de 2012, foi possível garantir R$ 12 bilhões ao ano até 2015, 8 vezes mais do que foi concedido neste ano, R$ 1,5 bilhão. “Esses recursos iriam para o bolso dos banqueiros. Conseguimos arrancar isso do orçamento, mas ainda não se resolveram problemas de carreiras, de recomposição de perdas e de direito de greve, e que agora será atacado”, destacou.

A questão, para ele, é: os trabalhadores serão propositivos ou não em relação aos projetos que tratam do direito de greve? Para Barela, a resposta é que são projetos que apenas restringem esse direito. Então, é preciso exigir a regulamentação da Convenção 151 da OIT, e o contrato coletivo de trabalho no serviço público. Esse passo é importante, segundo o palestrante, porque o governo assina termos de compromisso com categorias para que eles virem projetos de lei, mas, dependendo da correlação de forças no parlamento, mudam o projeto, os valores, a negociação feita, enfim. “O acordo firmado, portanto, não vira necessariamente projeto de lei com garantia de orçamento”, alertou o sindicalista.

Para ele, não é o caso de não se ter um projeto para fazer a disputa política, mas esse projeto tem que ser o mais simples possível, sem estabelecer detalhes como prazos de aviso de greve ou percentual de trabalhadores que não podem fazer greve, porque esses marcos interessam, sim, ao governo, e só servirão para limitar o direito de greve. Barela foi enfático ao afirmar que trabalhador não precisa disso. Afinal, antes da Constituição de 1988, os servidores públicos nem sequer podiam se organizar em sindicatos, e, para fazer a luta, criaram associações: “Fizemos grandes greves contra governo militares, Collor, FHC, e na Constituição vimos consagrado o direito de organização sindical e o direito de greve. Mas mesmo antes, quando tínhamos correlação de forças favorável, nós enfrentávamos o governo”.

Então, para ele, tem que permanecer o que está na Constituição, mas com um “puxadinho”, um adendo simples que não impeça o direito por causa do excessivo detalhamento sobre a forma como ele deve ser exercido. Serviços inadiáveis, por exemplo, afirmou Barela, são temas da própria negociação coletiva, seja com municípios, estados e União. Os servidores sabem muito bem o que é inadiável, não é preciso estabelecer isso, e devem deixar claro à população que o caos na saúde, na educação, não é culpa de grevistas, e sim do governo: “O Congresso, os empresários, o Judiciário, beneficiam os ricos, então o que nos vale é continuar na luta”.

O palestrante criticou pontos da “Proposta de regulamentação da negociação coletiva, direito de greve e afastamento de dirigentes do setor público”, feita por centrais sindicais. Dois artigos em especial chamam a atenção. O 26 diz que “os grevistas deverão garantir a manutenção de 30% dos serviços e atividades considerados inadiáveis, destinados a garantir as necessidades da população”. O artigo 28 prevê que “as faltas ao trabalho em decorrência de greve serão objeto de negociação, devendo produzir um plano de compensação que contemple os dias parados e/ou o trabalho não realizado”. Ou seja, centrais que representam os trabalhadores se adiantam, por conta própria, para definir percentuais e formas de negociação dos dias parados, um prato feito sob medida para o governo.

No debate, foi mencionada a greve dos servidores da saúde em SC, que está sendo severamente punida pelo governo Raimundo Colombo. Os três palestrantes enfatizaram que, nesse momento, a greve deve contar com o apoio de todos os sindicatos, e com base em uma solidariedade ativa e de compromisso com esses trabalhadores. Foi aprovada moção de repúdio contra a forma como o governo do estado atua, não abrindo negociação. Também foi aprovada moção pela anulação da reforma da Previdência de 2003, porque sua aprovação ocorreu em um período no qual parlamentares da base aliada ao primeiro governo do ex-presidente Lula receberam dinheiro para apoiar projetos, caso em julgamento na Ação Penal 470, do “mensalão”.