O Funpresp: o que ninguém explicou e ninguém entendeu

Paulo César Régis de Souza

A Presidenta Dilma sancionou o fundo de previdência dos servidores, o FUNPRESP, aprovado sob o manto do rolo compressor, com base em um conjunto de incertezas, ameaças e inverdades, confundindo os que estão aposentados e os que vão se aposentar novo no regime. Há algumas questões relevantes que jamais foram abordadas pelos defensores ou críticos do projeto e outras distorções pontualmente postas na mesa de discussões e que, em nome da transparência e do futuro da Previdência social pública, aqui repasso.

Os fiscalistas e os leigos venderam a ideia de que a previdência dos servidores federais estava falida e ameaçava o futuro do país! Três dados: (a) valor do PIB/ Produto Interno Bruto em 2001, R$ 4.143,0 trilhões. (b) Pagamento da folha de pessoal federal (civis e militares, ativos e inativos) em 2011, R$ 151,0 bilhões, menos de 5% do PIB. (c) Pagamento dos aposentados e pensionistas: R$ 70, 918,6, menos de 2% do PIB, nos mesmos níveis dos países industrializados. As despesas de pessoal em relação ao PIB ainda são irrelevantes e correm muito abaixo do limite fixado pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Não constituem ameaça.

Inventaram um déficit da previdência dos servidores com um número cabalístico de R$ 60 bilhões. Se de um lado a conta da despesa é correta e tem série histórica, a conta da receita é desconhecida. O governo federal sempre foi useiro e vezeiro em não pagar seus 22% e há dúvidas que tenha recolhido os 11% dos servidores. Houve um tempo em que os 600 mil celetistas do governo contribuíam para o INPS. Pois bem, o governo nunca recolheu a sua parte e a dos servidores ao INPS! O TCU cansou de denunciar a apropriação indébita, reconhecida pelo ministro Mantega. Em primeiro lugar, serão necessários dados transparentes e independentes da receita!

Não há nenhuma indicação, estudo, memória de cálculo de que o sistema de repartição simples esteja esgotado, ainda mais que o servidor contribui com 11% sobre sua remuneração e não até o teto do INSS. Isto significa (façam cálculo atuarial) que sua contribuição é compatível com sua aposentadoria integral, com 35 anos de contribuição e a expectativa média de vida dos brasileiros, 84,66 anos para quem chega aos 70 anos.

O regime de capitalização dos fundos de pensão tem seu charme , mas no Brasil, os fundos estatais foram aparelhados pelos partidos políticos, que se apossam de suas diretorias de administração e finanças para fins inconfessáveis. O rosário de fraudes é grande.

Só na União, há hoje 1.831 mil servidores. Destes, 926; 799 50,61% são ativos; 510.902, 27,90% são aposentados e 393; 407 21,48% são instituidores de pensão. Mais 1.169.206 – 63,85% – são civis, e 607.570 – 36,15% – são militares. As despesas da União tendem a crescer, até mesmo pela eventual correção da inflação. Sua redução será a longo prazo. Além, antes da Europa despertar para os controles de aposentadorias e pensões, o governo brasileiro, por ordem do FMI, arrochou, cortou, achatou e não concede reajuste.

Como em todo regime previdenciário, inicialmente as receitas dos novos fundos serão maiores do que as receitas. Haverá mais contribuintes do que beneficiários.

Nas contas públicas, entrando os gastos dos estados e municípios, não há dados efetivos sobre receitas e despesas. Será difícil, complicado e complexo estruturarem as previdências dos 27 Estados, DF e 5.500 municípios. Os dados são precários e esparsos, não servindo de referência salvo em três variáveis: (a) havia, em 2011, 6.637.834 servidores públicos estatutários e militares; (b) os fundos já criados por alguns estados e município tinham o saldo da aplicação de R$ 54,0 bilhões (c) tais fundos criados enfrentam pressões para emitir moeda , financiar projetos duvidosos, fazendo-se com eles o que fizeram com os bancos estaduais.

Prevalece a tese de que a criação do Fundo veio de fora pra dentro, com base em memorando de entendimento entre o Fundo Monetário Internacional e o governo brasileiro. É “herança maldita” do tempo em que o Brasil se sujeitava às ordens do FMI.

A comparação entre a despesa da União com 1.884 mil servidores (970.6 mil ativos, 516, mil aposentados e 397,2 mil pensionistas) aposentados e pensionistas e a despesa do Regime Geral de Previdência Social com 30,0 milhões é vilania sem conta como dizia Chico Previdência, o grande pesquisador do IPEA. A vilania é usada pelo governo e outros atores para humilhar os servidores. A vilania não diz que 80% dos beneficiários do RGPS recebem um salário mínimo, porque contribuíram pouco ou nada!

Os militares, que ficarão de fora dos fundos, tiveram despesa nominal de R$ 39,1 bilhões sendo R$ 15,7 bilhões para ativos, R$ 15,3 bilhões, para aposentados (reformados) e R$ R$ 9,6 bilhões para instituidores de pensões. Reformados e pensionistas levaram 59,56% da despesa, em ascendência. A exclusão encerra uma indagação: serão eles os únicos servidores do Estado brasileiro ou os servi dores civis não são mais servidores do Estado? Serão servidores de fundos?

A despesa de pessoal com o Fundo Constitucional do Distrito Federal foi de R$ 8 bilhões, em ascendência, já representou 5,29 % do total da despesa e 7,14% da despesa com pessoal civil.

Todo o charme do setor público será afetado. Outros pilares já ruíram nas últimas reformas, como a isonomia entre ativos e inativos e a isonomia entre civis e militares. Outros pilares estão ruindo como a aposentadoria integral e a incorporação de vantagens na aposentadoria.

Há justa preocupação com a gestão dos fundos. O risco de gestão política é real, basta ver qual a gestão dos fundos estatais hoje, todos nas mãos de políticos da famigerada base aliada. Há a crença, lenda ou sensação de que os fundos são fornecedores de recursos.

Não custa lembrar os futuros participantes dos três fundos: o teto do benefício do INSS (contribuição e beneficio) é de seis salários mínimos: R$ 3.916,20. Há uma década era de 10: R$ 6.220.00. Hoje ninguém se aposenta com mais de quatro e 80% dos 30 milhões de beneficiários do RGPS recebem o salário mínimo. No longo prazo, como sonhou o FMI, o governo brasileiro pagará apenas um mínimo aos aposentados do INSS e do setor público.

(*) Paulo César Régis de Souza é presidente da Associação Nacional dos Servidores da Previdência e da Seguridade Social (ANASPS).