O direito e o crime de Brumadinho: em defesa da Justiça do Trabalho

Entre as várias falas no Ato Nacional em Defesa da Justiça do Trabalho e dos Direitos Sociais, realizado dia 5 na Câmara dos Deputados, destacou-se a da presidente da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat), Alessandra Camarano Martins. O centro da manifestação foi o crime de Brumadinho, a partir do qual a advogada mostra as consequências das várias medidas que alteraram ou estão por alterar a legislação trabalhista, das privatizações, do sistemático desprezo pelos direitos constitucionais e pela vida humana. Uma fala contundente que diz muito desses dias tristes do país.

No vídeo, a manifestação está a partir de 1:30:05 até 1:39:13. Abaixo, o texto na íntegra enviado por Alessandra Camarano Martins, à qual agradecemos.

https://www.youtube.com/watch?time_continue=5504&v=eksKPezM3Xo

MANIFESTAÇÃO DA ABRAT

ATO NACIONAL DIA 05/02/19 CÂMARA DOS DEPUTADOS

POR: ALESSANDRA CAMARANO – PRESIDENTE

 

Boa tarde a todos, boa tarde a todas!

Cumprimento a mesa na pessoa do Vice Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr Luiz Viana, que ontem firmou um pacto junto com a ABRAT, para a defesa dos direitos sociais, para a defesa do direito do trabalho, defesa da dignidade da pessoa humana, o que nos engrandece e nos faz estarmos aqui com uma segurança maior.

A Advocacia Trabalhista, presente, eu cumprimento em nome do Presidente da Comissão de Direitos Sociais do CFOAB, Antônio Fabrício de Matos Gonçalves, Ex Presidente da ABRAT, Ex Presidente da OAB/MG, que também muito nos honra por estar neste cargo importante dentro do Conselho Federal.

Os presentes, eu cumprimento em nome de todos(as) os (as) Presidentes (as) de Associações Regionais aqui presentes, das 26 Associações de Advogados e Advogadas Trabalhistas filiadas á ABRAT, que no dia 21 enalteceram e trouxeram atos de envergadura, importantíssima para que estivéssemos aqui hoje. Foi o ponta pé inicial dessas defesas dos direitos sociais e todas, sem exceção, Associações de Norte a Sul do país se engajaram, se esforçaram e não esmoreceram para que os atos acontecessem.

Minha reverência, meu respeito, minha admiração a todos(as) os(as) Presidentes(as) de Associações de Advogados (as) Trabalhistas, pela coragem, doação, pelo esforço conjunto, na defesa dos direitos sociais, do valor social do trabalho, da dignidade do Ser humano trabalhador.

A ABRAT, ao longo de seus 40 anos de existência, possui um histórico de “defesa dos direitos sociais, das garantias e direitos fundamentais, do estado democrático de direito, da justiça social e do devido processo legal, bem como do bom funcionamento da Justiça do Trabalho”, pilares estes fincados em seu estatuto social.

Baseado nestes princípios não há como iniciar uma manifestação neste ato sem mencionar o crime ambiental ocorrido em Brumadinho, que coloca luz sobre problemas de retrocessos sociais, pautados, como a questão das privatizações; do cuidado com o meio ambiente; da necessária fiscalização dos órgãos de inspeção do trabalho em relação ao meio ambiente laboral; sobre as conseqüências da terceirização ilimitada; do contrato intermitente e da tarifação do dano moral e material em casos de acidentes de trabalho.

Trata-se do maior acidente de trabalho ocorrido no Brasil, o segundo mundial.

Um fator de aprendizado, por meio da dor, de proporções devastadoras para o meio ambiente e para a vida humana.

Este crime ocorre 34 dias após a MP que desmantela a estrutura de fiscalização do Ministério do Trabalho e que arrasta com a lama fatores de medidas protetivas que poderiam ter sido evitadas.

Mencionamos este crime ambiental neste momento e dentro desta Casa Legislativa que aprovou a reforma trabalhista sem o devido diálogo social e açodadamente, para que as vozes das almas dos trabalhadores mortos, que tiveram seus corpos misturados aos rejeitos de uma barragem rompida e que rejeita o sistema de proteção; que rejeita os laudos técnicos; que rejeita os fatores de risco.

Que as vozes das almas desses trabalhadores ecoem em nossas consciências, nos corredores desta Casa; no Poder Judiciário, para que a haja responsabilidade social em cada lei que for criada, em cada decisão tomada pela magistratura, para que a vida dos trabalhadores e trabalhadoras que recebem um salário mínimo, valha o mesmo que a vida do trabalhador e da trabalhadora que recebe dez salários mínimos, pois a lama que retirou-os do convívio familiar e da atividade produtiva é a mesma lama, com os mesmos rejeitos, com a mesma dor.

Que as famílias não sejam impedidas de acessar o Poder Judiciário pelo temor de uma condenação em custas e honorários.

Que essas famílias não tenham o prazo prescricional reduzido para o ajuizamento da ação, e que possam viver seus lutos doídos e possam aguardar o tempo necessário para a decisão na busca de uma reparação, que não pode se extinguir em apenas três meses após a sua morte, conforme vem previsto na PEC 300.

Que as entidades sindicais estejam cada vez mais fortalecidas para um trabalho coletivo de defesa da classe trabalhadora.

Que Brumadinho, sirva como reflexão para Parlamentares, Governadores, Presidente, Ministros sobre o quanto vale uma vida, sobre o quanto vale a dignidade do ser humano que produz e que se sustenta e que sustenta outras vidas humanas.

No dia 29/01 foi levada ao ar uma reportagem onde Índios pedem desculpas à natureza pelos maus tratos e pela tragédia ocorrida.

Pedimos às famílias dos trabalhadores mortos em Brumadinho e em nome deles e tantos outros que não têm em seu dia a dia o respeito aos valores sociais do trabalho e a dignidade da pessoa humana, também desculpas.

Que não seja necessário mais pedidos de desculpas no futuro à classe trabalhadora, pela situação de indignidade que vem sendo submetidos.

Que todos nós, homens e mulheres, permaneçamos com as bandeiras da igualdade hasteadas em vigília e em movimento.

A ABRAT está afinada e confluente com o núcleo medular do princípio fundamental da República Federativa do Brasil da prevalência dos direitos humanos;

Estamos atrelados com as regras constitucionais de igualdade entre brasileiros e brasileiras.

Estamos absolutamente conectados com o direito de reunião, que não pode jamais ser obstado, sob qualquer pretexto, ou mesmo penalizado, sob pena de no futuro não podermos realizar atos dessa envergadura e importância.

Igualmente estamos atentos e preocupados com a asfixia, com alta intensidade, do movimento sindical, o que vitimiza o espaço democrático, porque reduz ou anula até o poder reivindicatório indispensável para o avanço social.

A Constituição Cidadã deu relevo especial ao trabalho, reconhecendo-o como direito social fundamental e seus valores possuem preponderância na configuração da ordem econômica e em relação aos demais valores da economia de mercado, sendo proibido qualquer fator de retrocesso, que vem consubstanciado no artigo sétimo da Carta Constitucional, que é retórica na defesa dos direitos fundamentais da classe trabalhadora, exprimindo textualmente a obrigatoriedade de melhoria da condição social.

Normas internacionais, das quais o Brasil é signatário, estabelecem compromissos de garantia de avanços no Mundo do Trabalho e proibição de retrocessos, normas essas abarcadas no conjunto constitucional, no título destinado a direitos e garantias fundamentais.

Essa é a demanda da ABRAT. A defesa dos direitos sociais, das normas nacionais e internacionais de proteção da dignidade da pessoa humana, as regras civilizatórias, o estado democrático de direito, o que exige fortes instituições, que devem ser preservadas, entre as quais a OIT, a ONU, o Ministério do Trabalho, em especial sua tarefa indispensável de Fiscalização e Normatização, o Ministério Público do Trabalho, a liberdade total e pleno conjunto de prerrogativas da Advocacia.

Hoje, esse conjunto está sob ataque, diário, persistente, insistente, como é exemplo a PEC 300, que tem sido rechaçada pela ABRAT.

A ABRAT atua, portanto, na defesa dos direitos sociais e das instituições democráticas que asseguram a efetividade da Justiça Social. Qualquer tentativa de eliminação, fatiamento ou retirada do contexto especializado e autônomo dessas estruturas, representa rompimento com o Estado Democrático de Direito, dos direitos e garantias individuais, vedados também pelo artigo 60, da Constituição Federal, que não admite emenda a Constituição tendente a abolir os direitos e garantias individuais.

A ABRAT segue de mãos dadas com os direitos sociais, entrelaçada com o valor social do trabalho e conclama para que NINGUÉM SOLTE A DEMOCRACIA.

Muito Obrigada!