Fenajufe na CUT: desfiliar-se ou ficar?

Os trabalhadores brasilei-ros, e em especial os servidores públicos federais, estão vivendo um tempo novo de reorganização sindical. Os últimos dez anos mostraram que, com a eleição do governo Lula em 2002, já no início de 2003, na formação de seu ministério e secretarias, muitos dirigentes da CUT e da Força Sindical foram agraciados com cargos de ministros, secretários, assessores especiais e muitas outras posições de destaque na administração federal.

Este período foi emblemático para os trabalhadores, pois, consequentemente, estas lideranças passaram a defender as teses do governo federal e demonstrar cumplicidade com o governo Lula. Desde aquele momento político, a CUT passou de contestativa a meramente propositiva, deixando de exercer uma premissa elementar exigida pelos trabalhadores de uma central sindical de luta.

Os servidores públicos, até aquele período, depositavam na CUT a esperança de luta pela reversão do quadro neoliberal implementado pelo governo anterior, em especial a rediscussão de 56 medidas do governo FHC que suprimiram direitos dos servidores assegurados na Lei 8.112/90, Regime Jurídico Único, e a Emenda Constitucional nº 19/98, que tratava da reforma administrativa. Juntas, essas medidas promoveram o desmonte do serviço público e dos direitos dos servidores como:

 

#Proibição de conversão de um terço das férias;

#Fim de horas extras;

#Transformação dos quintos em décimos e sua posterior extinção;

#Proibição da incorporação de gratificação – quintos e décimos para os servidores ativos e também aos proventos de aposentadoria, transformando as vantagens já incorporadas em vantagem pessoal e desvinculando-a dos cargos ativos;

#Transformação do anuênio em quinquênio, limitando-o ao máximo de 35%, mas que em seguida foi extinto;

#Proibição da venda de 1/3 de férias, vedando-se conversão de dez dias em pecúnia;

#Extinção da licença-prêmio de três meses para cada cinco anos de exercício ininterrupto, como prêmio de assiduidade;

#A licença remunerada por motivo de doença em pessoa da família foi reduzida de 90 para 30 dias;

#Redução do número de servidores liberados para atividade sindical;

#Extinção das gratificações especiais de localidade, devidas a servidores em exercício em zonas inóspitas ou de precárias condições de vida;

#O tíquete refeição e alimentação foi transformado em dinheiro, sem garantia efetiva de correção;

#Regulamentação restritiva das chamadas carreiras exclusivas de Estado, que reúnem no máximo 8% dos servidores por esfera de governo;

#Tentativa de elevar a contribuição previdenciária dos servidores para até 25%, com efeito confiscatório, que foi barrado pelo STF por meio de liminar na ADIN 2010;

#Desvinculação da remuneração de ativos e aposentados em cerca de 20 carreiras no serviço público, criando Gratificações de Desempenho que não foram concedidas aos aposentados e pensionistas dessas carreiras;

#Negação da data-base dos servidores, deixando-os sem o reajuste devido, inclusive por força de dispositivo constitucional.

 

Omissão na luta

A posição da CUT foi tímida e até omissa em relação aos 56 ataques e também aos posteriores engendrados já nos governos Lula e Dilma, como o PL 549 (congelamento salarial), o PL 740 (direito de greve dos servidores), a reforma da previdência etc, defendidos abertamente por ex-dirigentes da CUT como a atual ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, ex-presidente do SINTE, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação na Rede Pública de Ensino do Estado de SC.

No plano político geral, a CUT, por seu atual presidente, recusa-se a assinar a campanha que está sendo organizada pelo Fórum Nacional das Entidades dos Servidores Públicos Federais cujo mote é a frase “Reforma da Previdência Comprada Tem Que Ser Anulada”. Por outro lado, assume a defesa partidária dos envolvidos na Ação Penal 740 do STF (mensalão).

Finalizando, muitos sindicatos de servidores e federações amadurecem e discutem a desfiliação da CUT ou já tomaram esta decisão, como é o caso do SINTRAJUSC, desfiliado desde 2005.

A diretoria do SINTRAJUSC vai debater com a categoria se a Fenajufe deve ou não continuar filiada a uma central que vive uma ambiguidade histórica de ser representante, entre outras categorias, dos servidores do judiciário federal e, ao mesmo tempo, atuar como defensora das políticas de pessoal do governo Dilma.

DesfiliaÇÃO em massa

No começo do primeiro mandato do governo Lula, a CUT representava a imensa maioria dos sindicatos de servidores federais e suas federações. Porém, com a reforma da Previdência e o papel no mínimo ambíguo da CUT naquela luta, com críticas pontuais e sistematicamente em defesa do governo, no qual tinha um de seus ex-dirigentes (no Ministério da Previdência), e diante da recusa de chamar as entidades de professores e de servidores estaduais e municipais para se unificar nessa luta (usavam o argumento de que a “reforma” só atingiria os servidores federais), houve um movimento de ruptura com a CUT. Isso se deu por parte de diversos sindicatos, federações e por uma gama cada vez maior de setores combativos do movimento sindical como um todo.

Entre as grandes federações e sindicatos nacionais se desfiliaram da CUT o Andes (professores universitários) e o Sinasefe (professores e servidores dos institutos federais de ensino), sendo que ambos ajudaram a criar e agora são filiados à central CSP CONLUTAS (Central Sindical e Popular). Saíram ainda a FENASPS (previdenciários), AssIBGE (servidores do IBGE) e FASUBRA (servidores das universidades). Há inúmeras entidades que nem chegaram a se filiar e na CUT restam apenas duas grandes entidades, entre elas a CONDSEF, que reúne os sindicatos que agrupam os servidores de inúmeras autarquias (geralmente órgãos sem muita concentração de servidores e espalhados em inúmeros planos de cargos e salários). Mesmo aí há um movimento crescente pela desfiliação da CUT. Por último há a Fenajufe que, apesar de contar atualmente com apenas uns quatro ou cinco sindicatos filiados à CUT, ainda está filiada a essa central governista.

A simbiose, ou pelo menos uma grande ambiguidade/apoio da CUT ao governo Dilma, se mostra bem quando se vê vários ex-dirigentes (quase atuais, como o último presidente da CUT) em cargos importantes e de confiança nos ministérios, nas diretorias e chefias de estatais e de bilionários fundos de pensões (Petrobras, BB, CEF entre outros).

Talvez isso explique o porquê da apatia/omissão de fazer fortes campanhas de denúncia de ações do governo que vão contra o serviço público e os direitos do povo, como é o caso da criação da Empresa Brasileira de Hospitais (uma “organização social”, portanto privada, que o governo Dilma/PT quer que administre os hospitais universitários). Com ela os funcionários podem ser contratados pelo regime de CLT sem concurso e sem estabilidade e também sem que haja necessidade de fazer licitações para a compra de materiais e medicamentos. Detalhe: o dinheiro para essa empresa continuaria vindo dos cofres públicos. Ataques como esse ou a criação dos fundos de aposentadoria privados para os servidores públicos não são alvo de grande campanha de denúncia por parte da CUT nacional.

Paralelamente a todos os ataques que os servidores públicos vêm sofrendo, particularmente nos últimos dez anos, a CUT e suas entidades nacionais tiveram o lamentável papel de esvaziar a Coordenação Nacional de Entidades de Servidores Públicos Federais por essa ser muito crítica aos ataques do governo, impossibilitando assim a realização de fortes campanhas ou greves nacionais de servidores públicos federais. Só em 2012, com o enfraquecimento da CUT nas principais entidades nacionais de federais, é que ocorreu uma grande greve do funcionalismo no Brasil inteiro.

Temos pela frente lutas cada vez mais duras contra o governo para conseguir a reposição anual e defender nossos direitos, e para sermos vitoriosos nas lutas é preciso haver, na organização dessas lutas, entidades que não sejam ambíguas e que não vacilem frente a qualquer governo. Os trabalhadores brasileiros sabem que não é fácil fazer uma greve ou luta, mas quando têm que lutar contra as manobras de uma direção governista ou patronal a luta fica ainda mais difícil.

 

Luta pelo PCS

Os servidores do Judiciário amargaram os efeitos dessa dubiedade de identidade na luta pelo PCS4 quando, próximo das eleições de 2010, dirigentes sindicais cutistas do sindicato de Brasília defenderam o fim da greve porque já estava garantido um acordo do então presidente Lula com o ex-ministro do STF Cezar Peluso e era só esperar passarem as eleições para que ele fosse encaminhado. Fizeram pior, chamaram a categoria do país inteiro para aguardar sem fazer greve, pois afirmaram, no site do Sindjus/DF, que o acordo estava garantido. Infelizmente os servidores sentiram na pele e no bolso o resultado dessa política de poupar o governo nos momentos críticos. Perdeu-se o melhor momento político (véspera das eleições para presidente, deputados e senadores) para pressionar e “sensibilizar” o governo e os deputados para aprovar o projeto.

Resultado: o PCS4 não foi aprovado, foi necessário fazer mais greves e mobilizações em conjunturas bem piores, para, afinal, em 2012, ter de engolir a proposta de Ayres Britto, que correspondia à metade do projeto original. Além disso o governo Dilma/PT resolveu cortar quase pela metade as parcelas deste ano e frente a isso o presidente do STF, Joaquim Barbosa, não se insurgiu exigindo respeito à autonomia do Judiciário. Ao contrário, mandou esperar a aprovação final do orçamento para começar a pagar as parcelas do projeto.

Também é de provocar estranheza a postura do Sindjus/DF de ameaçar não participar do próximo congresso da Fenajufe alegando problemas de finanças para colocar as suas contribuições em dia com a federação, o que provocou indignação na base de Brasília, pois esta via claramente que o seu sindicato vinha pagando religiosamente a CUT e estava, na realidade, fazendo um boicote político à Fenajufe. A forte pressão da base da categoria do Distrito Federal obrigou a direção do Sindjus/DF a voltar atrás e acertar as contas com a federação para participar do congresso.

É preciso inaugurar uma nova fase na Fenajufe, na qual a categoria não sinta que ela esteja vinculada ao governo federal ou aos tribunais. É preciso sair de dentro da CUT e abrir um tranquilo e certamente longo, mas necessário, debate de novas possibilidades de reorganização para facilitar e potencializar a luta de todos os servidores do Judiciário, do funcionalismo e dos trabalhadores como um todo por direitos e pela defesa dos serviços públicos.

Portanto a diretoria do SINTRAJUSC defende que na Assembleia de eleição de delegados para o Congresso vote-se pela desfiliação da Fenajufe da CUT.

 

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