A estabilidade do servidor público e as suas consequências na qualidade do serviço prestado

Historicamente, quando nos remetemos a um passado bem próximo e remontamos à péssima qualidade apresentada pelos serviços públicos sob seus diversos aspectos, ouvimos dos governantes os mais diversos argumentos para tal desempenho: falta de verba, falta de treinamento etc., porém esquecemos de analisar o elemento principal que é o foco dessa prestação de serviço, o servidor.

Quando analisamos contextos organizacionais diferentes, porém com o mesmo objetivo, atender às necessidades dos clientes, observamos rapidamente o vale que distancia a qualidade no serviço prestado por setores privados e o mesmo serviço oferecido por órgãos públicos.

Ao perguntarmos a qualquer concurseiro de plantão sobre as vantagens em ser um servidor público, com certeza dentre as opções por ele elencadas constarão a política e progressão salarial, as licenças, os afastamentos, os benefícios e principalmente a tão sonhada “estabilidade do serviço público”.

Não é por menos, após o período probatório de três anos, o servidor público adquire estabilidade funcional e passa a ser um “semi-intocável” perante a sociedade que por sua vez reverencia também tal atributo fortalecendo esse vínculo e disseminando tal ideologia.

Os servidores públicos de plantão com certeza estarão nefastos ao ler tal indagação e por sua vez se defenderão buscando argumentos na lei 8112 de 11 de Dezembro de 1990 que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da união, das autarquias e das fundações públicas federais. Deveras, lá encontramos as penalidades e principalmente em seu artigo 143 prestigiamos os dizeres da lei sobre o processo disciplinar administrativo.

Ótimo, tudo escrito como deve ser, o preto no branco, prático como os metódicos que a desenharam, porém há aspectos triviais que os mesmos não consideraram.

O artigo 149 dessa lei determina que:

Art. 149. O processo disciplinar será conduzido por comissão composta de três servidores estáveis designados pela autoridade competente, observado o disposto no § 3o do art. 143, que indicará, dentre eles, o seu presidente, que deverá ser ocupante de cargo efetivo superior ou de mesmo nível, ou ter nível de escolaridade igual ou superior ao do indiciado.

Contemporaneamente, o que observamos é a presença maciça do ideal corporativista implantado no seio da administração pública. Como exemplo clássico e fictício desse argumento podemos imaginar como seria o andamento e o veredicto de um processo disciplinar de um médico sendo julgado por uma comissão composta também por três médicos, certamente seria arquivado. E não adianta mostrar que o profissionalismo, está acima de tudo por que infelizmente o corporativismo anda um degrau acima das regras éticas que regulam tais profissões.

Cabe-nos notar também que num país cuja democracia está sendo galgada sob um histórico ditatorial e os cargos públicos são moeda de troca política, se torna necessário a defesa do cargo público, ou então o servidor corre o risco de estar empregado somente enquanto “fulano” ou “beltrano” for o atual gestor.

A estabilidade determinada pela lei 8112 torna-se então uma barreira aos ataques políticos realizados contra servidores, todavia engessa a qualidade do serviço público.

Ao analisar a obra de grandes estudiosos sobre a satisfação e motivação das pessoas como Frederick Herzberg, notamos que a estabilidade faz parte de um conglomerado de benefícios que Herzberg chama de “Fatores Higiênicos”. Estes fatores são aqueles que referem-se às condições que rodeiam o funcionário enquanto trabalha, englobando as condições físicas e ambientais de trabalho, o salário, os benefícios sociais, as políticas da empresa, o tipo de supervisão recebido, o clima de relações entre a direção e os funcionários, os regulamentos internos, as oportunidades existentes etc. Correspondem à perspectiva ambiental. Porém cabe salientar que as pesquisas sobre esses fatores determinaram que os mesmos não satisfazem ou motivam tais funcionários mas a falta deles causa sua insatisfação.

Herzberg ainda preconiza que há fatores que se referem ao conteúdo do cargo, às tarefas e aos deveres relacionados com o cargo em si. São os fatores motivacionais que produzem algum efeito duradouro de satisfação e de aumento de produtividade em níveis de excelência, isto é, acima dos níveis normais.

Ao observar as organizações privadas e públicas nota-se que a primeira preconiza com mais intensidade inclusive em sua cultura de resultados a implantação e o uso dos fatores motivacionais.

É necessário reorganizar os preceitos que norteiam a gestão pública, ancorar suas ações em processos sustentáveis e duradouros, reformular todo o complexo de benefícios, remunerações e avaliações de maneira de que o serviço prestado tenha, de acordo com indicadores pré-determinados, um nível aceitável de qualidade e que ao mesmo tempo satisfaça e motive o trabalhador. Redefinir ou balizar as ações de cunho político-corporativista, principalmente no que tange ao atributo legal, e além de tudo, é imprescindível que a sociedade perceba o teor da mudança, não só nos aspectos físicos que compõe o setor público, mas também através das ações protagonizadas pelos seus servidores, alterando assim seus conceitos e reposicionando os novos atributos que compõe o universo do serviço público. Sem contar que o servidor tem que ser responsabilizado pelo progresso da nação, deixando bem-claro e conscientizando-o que ele é pago pelo povo e que deve sim, mostrar serviço, pois a maioria das pessoas que contribui, pagando taxas e impostos para pagar seus altos salários públicos, está desempregada. A divida mínima que o servidor público deve ter com a nação e a população é respeito e dignidade, o que parece estar bem longe da realidade.

 

fonte: administradores.com